Escola é lugar de LAN house?
Tânia Ramos Fortuna

Escola é (ou deveria ser) lugar de tudo que tem a ver com a vida. E se a vida, na atualidade, produz o fenômeno das LAN house , este deve ser um tema presente na escola.
É preciso recordar as funções da escola: ela tem uma dimensão socializante, isto é, de preparação do jovem cidadão para o convívio em grupo e em sociedade; possui, também, uma função epistêmica, ou seja, deve estar a serviço da apropriação, por parte do aluno, dos conhecimentos acumulados pela humanidade, ao mesmo tempo em que deve propiciar a este aluno a construção de novos conhecimentos; e, finalmente, deve desempenhar a função profissionalizante, por meio da qual promove a qualificação para o trabalho.
Ora, a presença de situações de jogo na escola não só não impede o exercício de suas funções, como ainda pode contribuir para um melhor desempenho destas funções, enquanto meio de estimular o pensamento, o desenvolvimento psíquico, físico e cognitivo e promover a criatividade e a socialização. No entanto, estes são efeitos incertos das situações de jogo, dependentes de inúmeros e complexos fatores que incidem sobre o comportamento humano em sociedade. Esta incerteza é, freqüentemente, o motivo alegado por educadores para que as escolas não adotem atividades lúdicas e fechem-se à presença de novidades, preocupadas que estão com o cumprimento dos programas de ensino e das listas de conteúdo. É verdade que alguns educadores optam precisamente pelos jogos como modo de escapar ao cumprimento das funções da escola, o que, injustamente, difama a brincadeira, o esporte e o jogo mas, neste caso, a 'culpa' não é do jogo, e sim da intenção subjacente... Outras escolas e professores adotam os jogos como 'chamariz', como uma 'isca para pescar' alunos desmotivados para a aprendizagem. Pervertem o jogo, pretendendo manipulá-lo e manipular o jogador, e nisto não estão distantes - pelo menos no princípio - daqueles que adulteram máquinas caça-níqueis. A brincadeira e o jogo são dimensões do comportamento humano tão ricas, que não merecem tais tratamentos.
Contudo, o grande mérito da presença dos jogos na escola é a aproximação que permitem com a vida cotidiana, lembrando que a escola é lugar de vida e, assim, lugar de aprender e ensinar coisas significativas, que suscitam curiosidade e interesse, que se mostram importantes para compreender o ontem e o hoje e transformar o hoje e o amanhã.
E o vício? E a experiência de flow (fluxo em inglês), em que se perde o sentido do tempo e do espaço e em que o limite entre a atividade e a pessoa desaparece, como se ela estivesse em piloto automático, típica dos jogos eletrônicos, mas também da assistência prolongada à tevê, e que sugere alienação? E os temas violentos dos jogos, que parecem dessensibilizar os jogadores em relação à vida real? Aqui reside a importância do papel do educador (não só professor, como também os demais profissionais da escola e os pais e outros familiares), que deve ser capaz de mediar a relação com este mundo dos jogos, provocando a tomada de consciência da experiência.
Se uma sala da escola for transformada em LAN house, ela poderá estar, simplesmente, tentando atrair os alunos para a escola, sem transformar, pela presença provocante dos jogos, o modo de ensinar, os conteúdos ensinados, o papel do professor e do aluno. Mas se as experiências com a LAN house permitirem a vivência de amizade, solidariedade, crítica social, ao mesmo tempo em que se discutir a violência, situações que dão prazer e desprazer, injustiça, etc., então o jogo na escola estará contribuindo para o cumprimento de suas funções - embora sem certeza dos resultados. O jogo na escola é uma aposta.